INSTITUTO WANDA HORTA

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terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

A superficialidade da desocupação da Praça Coronel Jonas (*)


“A Praça Coronel Jonas, localizada no centro de Parnaíba, está sendo devolvida para os cidadãos e os vendedores, que ocupavam o logradouro de forma irregular, foram contemplados com novos espaços no Mercado Central, recentemente reformado pela Prefeitura de Parnaíba”, assim foi divulgado pela prefeitura mais um “ato histórico” desta gestão.
Esta praça padecia, assim como diversos espaços públicos da cidade, de uma ocupação irregular e desordenada promovida por comerciantes, feirantes e ambulantes. A decisão de “limpar” a área merece algumas considerações: primeiro, não se deve desconsiderar que há décadas dezenas de famílias se instalaram ali para desenvolver uma atividade comercial com fins de sobrevivência; segundo, os últimos governos municipais assistiram complacentemente tal ocupação, inclusive a atual equipe que está completando 12 anos que administra a cidade; terceiro, a medida de desocupação dos espaços públicos deve ser adotada com planejamento e critérios que contemplem inclusive os erros da própria municipalidade, não se pode simplesmente retirar as pessoas sob a fria determinação de que o espaço é público e de que fora “privatizado”. É preciso entender o contexto de como foi gerado o problema e do seu ato de desocupação.
Trago estas considerações não pela veemência da crítica como alguns mal interpretam-me. A cidade toda reconhece e enaltece, por exemplo, a retirada da ocupação da Praça da Santa Casa e das insalubres construções da área da Guarita. Creio que não há uma viva alma que discorde do valor e da necessidade do ato deflagrado pela atual gestão. Porém, no caso da Cel. Jonas, a desocupação deveria ter sido feita com mais critério e planejamento. Os pequenos comerciantes desta área reconhecem eles mesmos que estavam num espaço inadequado, mas repito, sob o olhar complacente dos nossos gestores. Retirá-los das calçadas e das praças é imperativo. Como também deveria ter sido a definição de “para onde levá-los?”.
A solução acertada seria, antes, a construção do anunciado shopping dos camelôs que o atual prefeito prometeu ainda em seu primeiro ano de governo e ainda não fez. Adiando ano a ano, chega ao final do mandato com esta dívida com a cidade. Antes de retirar os comerciantes das áreas públicas deveriam preparar tal espaço para aí sim “dar dignidade e instalações adequadas” a esses sobreviventes de uma economia frágil e que não gera oportunidades de emprego para a grande maioria da população.
A Praça foi desocupada! Festejam. Esta superficialidade com que o governo municipal trata as coisas é que precisa ser discutida com a responsabilidade e a profundidade que o caso requer. Uníssono foi o discurso: “a cidade começa a receber de volta um espaço público e os vendedores que o ocupavam, passam a ter dignidade para continuar seus trabalhos em instalações adequadas para receber melhor os clientes e impulsionarem as vendas”. E as outras áreas na cidade ocupadas irregularmente? Isonomia?
Existem realmente momentos em que a informação basta: o que é espaço de uso público? Quem pode usar e como fazê-lo? O que é interesse público? No entanto, há situações em que precisamos de uma explicação, e só a informação não é suficiente. Exemplo: qual o(s) critério(s) de desocupação? Para onde vão? Quem permitiu? Quais as razões? Quais as consequências? Eis a diferença. 
A Prefeitura Municipal informou sobre a desocupação, não explicou! A explicação tem de ter outra característica, que é difícil de ser exercida pela municipalidade em muitas situações. Quando a explicação não é boa e sintética, ela se apresenta cheia de ruídos e com muitos “veja bem” e “parece que”. Vale a pena lembrar que o conhecimento contribui para que as pessoas melhorem sua capacidade de análise e avaliação concreta, talvez aqui tenhamos a explicação de tanta superficialidade.
A gestão se esforça para informar à sociedade o acerto da ação, mas não tem como explicar por que muitos não receberam esse “espaço digno” para trabalhar. Basta passar pela Praça dos Poetas e pelas calçadas das ruas: Humberto de Campos e Almirante Gervásio Sampaio, mas espera aí: tiraram de um espaço público para ocuparem outro? Isso mesmo. É em pontos como este que divirjo e me insurjo contra a atual administração: o discurso pseudomoralista! Não se discute a importância dos espaços públicos ficarem desobstruídos, especialmente uma praça (a cidade tem poucas e cuida mal delas).
A motivação da desocupação é nobre: o princípio da supremacia do interesse público, o qual informa todo o direito administrativo direcionando as condutas dos agentes. No âmbito das relações sociais, surgem conflitos entre o interesse público e o interesse privado, de forma que, ocorrendo este conflito, há de prevalecer o interesse público, isto é, aquele que atende um maior número de pessoas. Nesse caso em apreço, a praça, por exemplo, deve servir à toda a população, ninguém discorda disso.
Entretanto não basta apenas dizer que há uma meta coletiva, a qual deve ser atingida porque abrange um maior número de adeptos. É preciso mais do que isso.  Então surge a importância de se questionar: “o que prevalecerá?”, “quais são os motivos de um interesse prevalecer sobre o outro” e “esses motivos” são justos e suficientes que possam justificar a restrição de um princípio em favor do outro? Quem viver, verá!

(*) Fernando Gomes, sociólogo, eleitor, cidadão e contribuinte parnaibano.

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